segunda-feira, 6 de abril de 2009

O amante

"Quatro são as necessidades básicas: comida, bebida, sono e sexo. De nenhuma das três primeiras fui capaz de transformar em ofício.”

Cuspia ele o texto pronto para qualquer pregador de Jesus ou testemunha de Jeová que o abordava. Tinha corpo de homem e rosto de anjo como um Dorian Gray sem quadro e carregava algo de suspeito nos ombros.

Passava suas tardes lendo no sebo de um amigo de profissão – que herdara do pai o lugar decadente e a vergonha.

À noite, nosso homem era antagonista de mulheres casadas, jovens curiosas e viúvas pudicas. Era verdadeiro amante das mulheres e em cada ruga e dobra de pele de suas musas, escrevia sua história. E lia tantas outras nos corpos nus desprendidos de recato.

Conquistava a cada uma delas como Quixote e os moinhos de vento e também permitia ser conquistado pelos cabelos soltos no travesseiro da manhã, pelos choros borrados dos lençóis, pela pele febril entre suas mãos e pelos risos histéricos no meio de um silêncio desordenado.

Numa leitura de um dia qualquer, congelou seus olhos num cenário de sua memória e sozinho naquele sebo, riscou um fósforo.

Antes que fosse abandonado pelo tempo – pois apesar de parecer, não era Dorian-deixou descansar seu coração no calor de suas mulheres de papel.

Sem culpa de ter amado mais do que o mundo pode permitir.

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