domingo, 8 de maio de 2011

Fui eu ou o amor?

O anel duplo de zebra ficou no canto da pia do banheiro. Os dedos dentro dele se foram. Tocaram por última vez meu rosto e abriram porta. Tive tanta raiva daqueles dedos gelados tocando meu rosto. Raiva, porque, por um segundo, achei que era mentira. Afinal de contas, a dona do anel de zebra era atriz. E quando se tratava de discussões,ela era profissional. Então tive raiva dos dedos gelados, porque achei que eles também-junto àqueles olhos inchados- eram a obra-prima de sua grande cena. A despedida. E ri, quando pensei que por um segundo ela estaria me esperando sair, ao mesmo tempo que fingisse esperar o elevador. Respirei. Em alguns momentos, eu gostava das cenas, dos dialogos e frases de efeito. Quando eu sentia que poderia atuar junto a ela.
E o roteiro eu já imaginava: Sem muita paciência, eu sairia do apartamento, olharia aquela pobre menina que fingi não chorar (quando de fato já não chorava). Eu veria em seus olhos o doce prazer inevitável de me fazer ir atrás dela.Uma vez mais. Eu faria uma expressão de "só porque eu te amo muito" e respiraria forte. E a tomaria pela cintura e a abraçaria rápido para que não dissesse mais nada. E esperaria ela fazer menção de entrar novamente no meu apartamento. Ela assoaria o nariz. Molharia os olhos. E voltaria com um sorriso infantil. E eu sentiria raiva de novo. E a raiva passaria assim que aquela boca fresca me beijasse como se fosse para sempre.
Então fui ensaiado para a grande cena.
E pela primeira vez, nessa sessão, o final era outro.
Ator amador, pensei.

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